sábado, 16 de abril de 2011

DOS RITOS E CERIMÔNIAS DE PASSAGEM: HOMENAGEM A HISTÓRIA DO OUTRO, A MINHA HISTÓRIA...











Eu sou toda esquisita, toda diferente. No último sábado, dia 29 de janeiro, fui homenageada pelos formandos de Pedagogia da UESB/Jequié, turma 2010.2, e ainda que tenha ocorrido um atraso considerável para ter início a colação de grau da turma, gosto de tudo nesse rito de passagem, inclusive, desse atraso: a espera para dar início a cerimônia, momento que me permite circular entre os alunos e seus familiares, meus colegas e funcionários da UESB; a cerimônia de colação de grau em si mesma, que me proporciona conhecer um pouquinho mais das pessoas que eu ajudei a formar; a emoção que flui no abraço apertado que os formandos – agora formados – trocam com seus “padrinhos”; o reconhecimento e a saudade publicizada dos parentes e amigos que partiram e que de forma intensa, contribuíram para que aquele momento se concretizasse; os cabelos e a maquilagem feitos no capricho; os belos vestidos.
No final das contas, acho que o que eu gosto mesmo é ver os meus alunos se despiram das formalidades que regulam o cotidiano da vida acadêmica, para se tornarem simplesmente pessoas comuns, a quem nós professores, não devemos nada. Pessoas que deixam de se preocupar com notas, com a produção de artigos, fichamentos, resenhas, seminários, etc para se tornarem novos colegas. Pessoas que deixam de, a partir daquele momento mágico, nos tratar como opositores, e passam a reconhecer que alguma novidade trouxemos as suas vidas.
Fico pensando também, no desprendimento e humildade que só a profissão docente permite: preparar o outro, na expectativa que aquele outro, um dia nos supere. E quanto mais ele nos superar, mas sensação de orgulho teremos.
E por isso mesmo, crio na minha cabeça imagens quase completas de quem foram as “professorinhas” de figuras como Paulo Freire – tão lembrado nesses momentos solenes –, em seus tempos de menino no Recife, Pernambuco. Quanto orgulho elas devem ter tido do ilustre educador. Quando reconhecimento esse consagrado educador devia ter de por suas “professorinhas” do Recife...
Penso mais próximo, também. No abraço apertado que cada formando, que cada formanda, troca com seus familiares, imagino as trajetórias de vida de cada uma das figuras humildes que colocam anéis, entregam diplomas e ajeitam faixas. Em sua maioria, uma gente simples, que não raro sabe apenas assinar o nome, mas que transformou em um projeto de vida tornar o(a) filh(a)o, o net(a)o, “doutor(a)”,  acreditando firmemente que assim, as suas vidas e as deles serão transformadas, também. E por que, não?...Mas isso tem muito haver com a escrita de nossa história na Universidade.
Evidentemente, estou consciente que o labor cotidiano do exercício profissional traz outras tensões, talvez até mais complexas do que a Universidade apresenta – a rotina extenuante e com prazos limitados, a necessidade de produção e reconhecimento pela comunidade, as cobranças das chefias, o contato com o outro –, contudo, no momento em que as pessoas se entregam aqueles ritos (a cerimônia, principalmente), tudo parece ser esquecido e prol da comemoração merecida. Os aluno(a)s merecem a comemoração, tanto quanto os seus familiares e amigos, e nós, professores, que “cada um no seu quadrado”, contribuiu de algum modo para que cerimônia se tornasse um momento real.
E modéstia a parte, nós não contribuímos com a formação de qualquer profissional. Pela equipe de trabalho que o Curso de Pedagogia da UESB consegue reunir, pela qualidade dos alunos que temos, nós formamos profissionais de excelência, o que nos permite ostentar a marca de que torna Jequié especial no cenário da educação baiana “Jequié, cidade educadora”.
Meu santo é velho! Reconheço, em alguns momentos da minha vida preciso ser chata, e exerço com maestria a minha chatice, por isso não permito colocar as minhas emoções num lugar de prestígio para fazer uma afirmação desse tipo levianamente, até porque reconheço que ela tem uma verve política.
Meus termômetros para reconhecer o quanto a formação dos alunos de Pedagogia é de qualidade são dois: meu renovado empenho para tornar minha prática melhor – sim, porque se me sentisse desestimulada procuraria um outro que fazer – e meu filho de 7 anos, que frequentou as escolas mais caras de Salvador, e ainda assim detestava a sua rotina escolar.
Hoje, morando em Jequié, me sinto segura que em termos da proposta de mudança que fiz para ele – mudar de cidade, mudar de escola, de professora, de coleguinhas –, e tenho consciência de estar oferecendo o que há de melhor, na medida em que, no final do ano de 2010, momentos finais de suas atividades escolares, foi ele mesmo me pediu para permanecer na escola em que está matriculado, e creiam, não foi somente pela companhia dos amigos, mas, porque o projeto político pedagógico da escola é sedutor para quem deve ser: ele, aluno.
Tantas vezes confessei o meu apreço pelos rituais de formatura, e não me canso de fazê-lo, porque acredito que sejam as histórias pessoais expostas nesses momentos, que tornam a vida especial, a minha carreira docente dignificante. A minha história em relação a esse tema é emocionante, linda, comovente porque, da última vez em que vi meu pai ele - internado por conta de um derrame cerebral -, me deu o dinheiro que faltava para ultimar os preparativos de minha formatura, e num gesto de despedida desse plano, decretou que ainda que se ele não estivesse mais aqui, eu comemorasse com festa o alcance dessa meta, por ser a última das suas 3  filhas a se formar no nível superior. Minha irmã, mais nova (já falecida) era Economista e a mais velha, se formou em Direito, sendo que há mais de 13 anos, tornou-se Juíza Federal do Trabalho
Ainda que meu pai não fosse exatamente um homem humilde, pela quantidade de informações (lia 3 jornais todos os dias; 1 folha deOs Sertões, também, além de me aproximar do gosto pela boa música e amar a literatura de Edgar Alan Poe -  e vivência que amealhou nos 66 anos de vida em que esteve por aqui considero que, pelas posturas que ele tomou - recusou-se a entrar na faculdade, porque estava convicto que a boa formação técnica lhe bastava - ainda lhe faltava bastante para ser considerado um homem culto...ou será, prático?
Na minha formatura eu comemorei! Estive praticamente sozinha nesse momento, porque ninguém da minha família me acompanhou, mas eu festejei alicinadmente, delirantemente para “beber o seu morto” mais querido.
É realmente uma pena pensar que por conta de uma tradição (inventada) estúpida, minha mãe e minhas irmãs, não queiram ter representado o meu pai naquele momento. Para mim, bem fazem as pessoas “da roça”, que oferecem para os convidados do enterro a sua melhor cachaça, e "se riem" dos feitos do falecido. Para mim, aliás, quanto mais querida a pessoa fosse, mas comemorada a sua vida/relação com o outro deveria haver.
Na minha formatura eu “bebi dessa cachaça”, "bebi o meu morto" e se pudesse quando cheguei em casa, teria posto o aparelho de TV no volume mais alto, o aparelho de som também, porque merecemos eleger, ao menos um dia na vida para nos alienarmos em relação a tristeza, merecemos eleger um dia na vida para expurgar as formalidades, merecemos acreditar que o amanhã será melhor, porque é isso que as formaturas representam: a crença que o alcance de uma meta nos fará tornarmo-nos seres humanos melhores.

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