sábado, 16 de abril de 2011

COLUMBINE NÃO É, OU É AQUI?





Vou pular a parte em que me justifico por desejar que essa tragédia não tivesse acontecido, porque acho que esse desejo é óbvio, pelo menos nas pessoas normais. Apesar de nossa vontade, no entanto, infelizmente aconteceu: um doente mental entrou numa Escola Pública do Rio de Janeiro e assassinou a tiros 13 crianças deixando-nos em pânico, a fazer análise e a tecer comparações.
Meu pânico instala-se por razões obvias: NÃO ME SINTO SEGURA, quanto a proteção que o Estado que me oferece, nem muito menos, me sinto segura em relação à proteção que compro a R$10,00 mensais da Associação de Moradores do bairro aonde moro, o Jequiezinho, Jequié. Acho inclusive, que o preço que pago, faz fuz ao nível de segurança que me é oferecida, pois, por essa compra passo a ter "direito" de ouvir um sujeito de cara ameacadora - o mesmo que cobra é o mesmo que apita - apitando nas madrugadas, geralmente insones, inclusive, por causa do som estridente de tal apito, que não me deixa dormir. 
Para me proteger da fragilidade da (in)segurança que é oferecida eu, tal qual a pequena/grande Jade – da história de assassínio na escola pública do Rio de Janeiro, que desenhava ao som dos tiros que lhe ameaçavam a vida –, procuro desligar o cérebro das perversidades do mundo e como ela invento castelos; monto uma trincheira interna maior que os muros de Tróia; me encastelo dentro de mim mesma, como bem fez Maria, a rainha louca de Portugal, e fico inventando histórias fantasiosas de heróis, cheios de desprendimento, de coragem. Heróis de filme de ação...bom são as minhas estratégias!...
Para entender o que aconteceu no Rio de Janeiro, também articulo outras táticas: escuto a “voz da razão” de notório saber da Psiquiatria a tentar explicar a “tsunami da alma” de um ser humano, entrincheirado dentro de um universo de delírios. Ainda que sem abrir mão de adjetivações do tipo assassino, perverso, todos foram sinceros no reconhecimento de que o que aconteceu foi inevitável porque, mesmo eles, profissionais das mentes e alma, não poderiam prever quanto aconteceria à erupção do evento que devastou a vida de tantas famílias, inclusive, a do criminoso, cujo corpo ainda aguarda para ser enterrado na fria pedra do necrotério.
Somente me senti contemplada por uma fala. A de uma Antropóloga, que escapando da avaliação psiquiátrica, evidentemente, esforçou-se para explicar porque não se pode comparar o massacre de Columbine com o caso brasileiro. Discutindo a questão do acesso a arma nos Estados Unidos e no Brasil, a professora argumentava inteligentemente que, diferentemente do que ocorre nos EUA, aonde os cidadãos são orientados desde muito cedo a possuir armas como forma de proteção as suas “propriedades” – aí incluindo as suas famílias – aqui no Brasil, as armas servem como instrumentos de coação e medo, portanto, enquanto lastros para a promoção de ataques de cidadãos/cidadãos, polícia/cidadãos e bandidos/cidadãos. Para exemplificar o que se quer dizer, basta percorrer os jornais diários que anunciam as "possessões momentâneas" que dominam as almas humanas imersas no universo do desejo do revide...contra o chefe, que lhe humilha; contra a mãe ou a madrasta que os maltrata; contra o estranho que lhe olha feio. Os mortos nessas tragédias da vida urbana, projetam na mente dos criminosos, verdadeiros monstros de um cotidiano isento de qualquer possibilidade de afeto.
Não me atrevo a dizer que nos EUA a violência seja menor que no Brasil, porque sei que o tamanho da riqueza da maior potência do mundo capitalista é proporcional ao tamanho da pobreza que ele produz, contudo, a sociedade americana, ao menos preocupa-se em justificar, via de regra, através do discurso da preservação do direito da propriedade e inviolabilidade do lar, a defesa dos seus cidadãos. Aqui no Brasil, não é assim. Compramos armas, sem termos direito ao porte, para mostrarmos aos outros que somos mais homens, mais mulheres, demonstrarmos a nossa força opressora diante do outro.
E essa sensação de poder que a arma de fogo nos dá, nos deixa absolutamente transtornados. Uma pessoa muito próxima de mim inclusive, que possui porte de acordo com o que preconiza a lei, uma vez permitiu que eu tivesse acesso a sua arma. O corpo tremia feito “vara verde” e a sensação de poder, é indescritível nos poucos segundos em que estive com ela nas mãos.
E se há alguma coincidência entre o episódio americano e o brasileiro, essa identidade se localiza no modo como a aldeia global procura se harmonizar com as desgraças: imitamos o pouco que é bom e o muito que é ruim de tudo que vem da Terra do tio Sam. O doente mental Wellington Menezes de Oliveira, por exemplo, certamente tinha como heróis figuras comuns de vídeo games em que o mérito é conseguido com a simulação da morte, reproduzida nos mínimos detalhes.
Não sou Psiquiatra, mas fico pensando em quantas projeções o desequilibrado Wellington Menezes de Oliveira expurgou com seu gesto tresloucado de transferência: a mãe biológica, que não tinha condições de lhe dar amparo; os colegas que com ele praticaram bulling...todos essas personas que lhes abandonaram ou perseguiram, representadas nas figuras das crianças inocentes que perderam a vida. E no som de cada tiro, um grito lançado pelo assassino: eu estou aqui...prestem atenção em mim.
E o pior disso tudo é termos que guardar o nosso dedo acusador dentro dos bolsos, porque o cara é insano, inimputável, portanto, perante a lei. Sinceramente – retornando ao primeiro parágrafo desse texto – se se pudesse eleger outros atores dessa tragédia, preferia que ela tivesse sido cometida por um assaltante comum, porque a ele seria legítimo dirigir a nossa fúria, afinal, nesse tipo de doença (a mental), ninguém tem culpa de estar acometido.
Culpar a quem por essa tragédia? Acho que por vício e dificuldade de não encontrar a quem culpar, penso que no máximo poderíamos questionar ao Pastor da Igreja Testemunha de Jeová que tipo de ascendência ele tem sobre o “seu rebanho”. Nada acintoso, nada agressivo porque, principalmente, no que tange a compreensão – mínima que seja – do que se esconde na alma humana, lideres religiosos de qualquer denominação, aparentam grosseira ignorância. Falo como católica, porque não me esqueço da recusa de um padre em ouvir as minhas confissões, simplesmente porque, julgando-me pela aparência – modo de vestir, no seu entender, impróprio – não me achou digna de perdão transferido para ele por Deus. E eu encolhida, humilhada, “ensaquei” a minha angústia, expurguei o “meu pecado” através do choro solitário e nunca mais procurei um profissional padre, bispo, pastor para confessar coisa nenhuma, preferindo a partir daí a companhia comprometida dos bons amigos que tenho.
Tanto para Wellington, quanto para nós, seus juizes e carrascos, a melhor coisa a ser feita foi morrer. Fico pensando no que faríamos com figuras assim se tivessem sobrevivido. Fico pensando que em proposta teríamos para o seu futuro: o encarceramento numa instituição de atulho de louco condenados ou o “suicídio” nas mãos de um policial, tal qual o que vitimou o assaltante do ônibus 174

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